Desculpatória
Daniel Péricles Arruda (Vulgo Elemento)
Penso em oferecer um curso com o nome Desculpatória. No entanto, talvez as pessoas não tenham interesse, assim como na experiência de Rubem Alves (1933-2014), relatada no texto Escutatória (1999). Não sei bem se as pessoas se preocupam com isso. Parece-me que elas preferem atacar. Mesmo assim, a intenção desse curso é proporcionar um espaço de escuta e reflexão sobre os modos e os objetivos de pedir desculpas.
Na atualidade, principalmente com a proliferação das redes sociais, é comum encontrar pedidos de desculpas que, devido à repercussão negativa, ou polêmicas de certas narrativas e comportamentos, por exemplo, pessoas vêm a público para se desculpar. Assim é possível ouvir as frases: “Quero pedir desculpas para quem se sentiu ofendido”; “Caso alguém tenha se sentido ofendido, peço desculpas”; “Não foi a minha intenção”; “Quem me conhece sabe que eu não sou assim”; “Eu não penso isso”; “Eu não quis dizer isso”; e/ou “A culpa é do racismo estrutural”. Se olharmos bem, são frases questionáveis, porque dão margem à isenção e transferência da culpa…
Por outro lado, muitos daqueles que criticam os demais, por vezes, são os mesmos que, posteriormente, poderão estar na mesma posição, repetindo as mesmas frases já citadas. Em nossa sociedade, todos carregam suas pedras, e todos, em alguma área de suas vidas, têm o telhado de vidro.
Assim, fico pensando nesse modelo de pedido de desculpas que não se desculpa, e sim devolve a culpa, logo, acaba por ampliar o erro. Desculpar-se não é culpar o outro. Certamente, esse não é um assunto simples, pois articula-se a outras dimensões e interesses. E nem todos os que pedem desculpas, de fato, se sentem culpados ou não demonstram arrependimento, apenas pretendem permanecer no anonimato de sua própria falha. Por isso, entendo que também aprendemos a nos desculpar, bem como aprendemos a aceitar as desculpas, o que não é uma obrigação. Cada situação implica interpretação!
Considera-se que há várias formas de desculpar-se, seja por meio de poucas e importantes palavras ou de pequenos e relevantes gestos. De todo modo, percebo que pedir desculpa, a desculpa verdadeira, exige que a pessoa assuma o que fez; que reconheça ter realizado a ação; que demonstre preocupação com o outro; que se comprometa em reparar o dano causado, quando possível, e em não repeti-lo; que a pessoa tenha espaço para explicar e refletir sobre o que fez; com ressalvas, estamos falando de seres humanos e de situações muito complexas! Contudo, dentro de uma hierarquia, se pede desculpa por esbarrar levemente em alguém no metrô, assim como em ações mais severas. Em uma hierarquia, depois da desculpa, esteja o pedido de perdão.
Desculpar-se, verdadeiramente, assim digo, tem possibilidades de evitar ou cessar afetos negativos, bem como modificar a situação causada. Pedir desculpas é muito mais que um gesto de educação, é um caminho para transformar-se, um modo de evitar que a faísca se transforme em incêndio. Porém, não são todos que se dispõem a assumir a humildade desse gesto, que pode ser entendido como humilhação ou rebaixamento de sua moral.
Portanto, esse curso é exatamente para aqueles que se sentiram ofendidos por este texto!